Mar à Conversa | As Alterações Climáticas e a Pesca de Setúbal

O impacte do aquecimento da superfície do mar nas espécies piscícolas capturadas em Setúbal, com reflexos na variedade sazonal das capturas, foi abordado, no dia 11 à tarde, numa palestra sobre alterações climáticas do ciclo de encontros científicos “Mar à Conversa”.


A bióloga marinha Rita Gamito Lopes, que conduziu a sessão realizada na Casa da Baía, abordou a forma como as alterações climáticas se estão a refletir no setor da pesca setubalense, numa exposição suportada por um conjunto de dados recolhidos entre 1927 e 2012 a partir de estatísticas do porto de Setúbal.

De acordo com as conclusões de um estudo, da autoria da própria investigadora, a temperatura média da superfície do mar na costa de Setúbal está a subir de forma “muito acentuada” devido às alterações climáticas, o que, alertou, vai ter várias consequências no bem-estar humano e nos ecossistemas marinhos.

A oradora, analisando os desafios que o setor enfrenta no concelho sadino, estudou os desembarques oficiais das espécies piscícolas locais mais frequentes e as relações destes com a temperatura da superfície do mar, a precipitação e a oscilação da pressão ao nível do mar, no inverno, do Atlântico Norte (NAO, na sigla inglesa)

“Entre 1927 e 2012, a temperatura média da água aumentou 0,9 graus celsius. Embora não se note, é um aumento muito grande”, assinalou a bióloga.

Rita Gamito Lopes explicou também que as principais capturas de pesca em Setúbal em 1927, nomeadamente a sardinha, a cavala, o carapau, o choco, o linguado e o polvo, mantiveram-se como principais referências em 2012.

No entanto, indicou, os desembarques destas espécies oscilaram ao longo do tempo, correspondendo “a alterações nos parâmetros ambientais”, particularmente devido ao aquecimento da temperatura da água, prejudicial para muitas espécies e benéfico para outras.

De acordo com o estudo, os desembarques de sardinha, por exemplo, apresentaram uma tendência decrescente e estiveram negativamente correlacionados com a temperatura de superfície do mar e com a oscilação do Atlântico Norte.

Ao invés, os desembarques de cavala e de linguados têm vindo a aumentar desde 2000, por beneficiarem com o aquecimento da superfície do mar.

A bióloga marinha referiu que aumentos ainda mais acentuados na temperatura do mar constituem um desafio para a pescas de Setúbal no futuro, o que “não implica, necessariamente, um cenário negativo” para a região.

As técnicas de pesca polivalentes, frequentes em Setúbal, mostraram ser mais adaptáveis e menos vulneráveis às alterações climáticas.

Por outro lado, “a grande sensibilidade da sardinha às mudanças do clima torna as pescarias de cerco particularmente vulneráveis às alterações climáticas”.

Além dos efeitos das alterações climáticas na pesca de Setúbal, Rita Gamito Lopes fez um enquadramento histórico sobre a pesca e abordou os efeitos das alterações climáticas na costa portuguesa e o regime de afloramento costeiro, particularmente importante para a riqueza e diversidade do ecossistema costeiro e para as pescas.

A palestra “As alterações climáticas e a pesca de Setúbal” do ciclo “Mar à Conversa”, promovido pela Câmara Municipal de Setúbal no âmbito das atividades lúdico-pedagógicas de Setúbal Terra de Peixe, contou com a presença a vereadora do Ambiente, Carla Guerreiro.

O projeto “Mar à Conversa” constitui-se, desde 2018, como um espaço de apresentação e discussão de projetos técnicos e científicos relacionados com o mar e as espécies marinhas.