Maria de Lurdes, 89 anos, conhecida como D. Milu, apesar da idade, nada a demove de subir os 28 degraus que dão acesso ao Arquivo Municipal de Setúbal, guardador da história da cidade. “Sou setubalense, mas nunca vim ao arquivo. Estou muito curiosa”, refere, animada.

A sala de leitura é o ponto de partida da visita, promovida pela Câmara Municipal de Setúbal. Neste espaço, sóbrio e com luz natural, as mãos podem folhear pedaços da História. Numa mesa pode consultar-se documentos arquivados, de obras a óbitos, passando por atas oficiais, mas com todo o cuidado.

Mariana Garraz, 82 anos, é convidada a sentar-se, mas prefere olhar primeiro para a imensa coleção da sala. “Primeiro, tenho de ver, depois é que me sento”, anuncia, deslumbrada.

Os idosos, com um ar curioso, anseiam saber mais sobre um local que a maioria nunca antes visitara. Ouvem com toda a atenção a explicação de Nuno Soares, do Arquivo Municipal de Setúbal. “Aqui estão presentes as memórias de todos os setubalenses, a riqueza do património documental do Município”, refere, em conversa informal, para salientar a importância do local.

Da sala de leitura abre-se a porta à sala de depósito, um lugar com corredores repletos de testemunhos, que, desde 1953, guarda dois quilómetros de documentação e acolhe uma quantidade enorme de papel gasto pelo tempo e com cheiro a História. O grupo manifesta logo a surpresa. “Tanta prateleira e tantos papéis! Isto tem anos e anos.”

Atenta às prateleiras está Maria Luísa dos Santos, 67 anos. Quando olha para a secção do ano de 1984 não evita um sorriso. “Já passou tanto tempo, nessa altura ainda era jovem.”

Pormenores da história local, social e económica podem ser explorados nos arquivos escritos, fotográficos e digitais. “Nunca pensei que o arquivo fosse tão grande”, confessa a utente do Centro Comunitário de Vanicelos.

Na sala técnica, é hora de descobrir o que está por trás de todo o processo, desde que os documentos chegam às mãos dos arquivistas até que passam para as dos leitores.

Uma máscara, pincéis e luvas são materiais imprescindíveis na limpeza dos documentos. Retira-se tudo o que é nocivo, como clipes, agrafos, tachas, de forma a manter sempre a ordem original. “Isto é realmente muito interessante, mas dá muito trabalho”, constatam os idosos.

Depois de limpo, o documento é digitalizado e inserido na base de dados DigitArq, que permite “usufruir à distância, através da internet, de um conjunto de serviços que apenas são disponibilizados presencialmente no arquivo”, explica o técnico Nuno Soares.

O armazenamento é a última etapa do processo. Os papéis são presos com uma fita de nastro, de forma a garantir a preservação dos documentos e, depois, acondicionados em pastas devidamente identificadas no exterior.

À saída do arquivo, é recordado o incêndio da madrugada de 5 de outubro de 1910, no decurso da Implantação da República, que arrasou quase por completo o edifício dos Paços do Concelho, destruindo todo o espólio documental do município.

No final, ainda há tempo para admirar o Salão Nobre, onde o grupo de 15 idosos é recebido pela presidente da Câmara Municipal, Maria das Dores Meira, que vinca a importância do arquivo. “É a história da cidade e o guardião da memória do povo setubalense.”

A autarca destaca que, a par destas visitas, o arquivo desenvolve o projeto AnimArq, programa educacional que sensibiliza as gerações mais novas para o “dever de guardar e preservar um património que é de todos”.

Além deste grupo do Centro Comunitário de Vanicelos, o projeto “Por detrás de…”, que dá conhecer à comunidade local espaços menos acessíveis, promoveu, no dia 6, à tarde, uma visita de utentes do Centro Comunitário de Santa Maria da Graça.