Cerca de uma centena de moradores reuniu-se numa assembleia, que decorreu na EB+S Ordem de Sant’Iago, na Bela Vista, para avaliar o trabalho desenvolvido, desde 2012, no âmbito do Nosso Bairro, Nossa Cidade, e aprovar um documento que define os compromissos e orientações a seguir nos próximos cinco anos.

O encontro serviu também, como sublinhou a presidente da Câmara Municipal de Setúbal, Maria das Dores Meira, na sessão de abertura dos trabalhos, para a autarquia e a Junta de Freguesia de S. Sebastião avaliarem “o apoio que prestaram às decisões que os moradores coletivamente assumiram e que se traduziram em mudança positivas para todos os que vivem na zona da Bela Vista”.

Na sessão de abertura, que contou ainda com a intervenção do vereador responsável pela implementação do programa, Carlos Rabaçal, e as presenças do presidente da Junta de Freguesia de São Sebastião, Nuno Costa, da chefe do Serviço Municipal de Habitação, Raquel Levy, e a representante dos moradores Domingas Rocha, a edil vincou a importância dos princípios do programa resumidos na ideia de “promover lideranças autónomas e democráticas que desenvolvam em autonomia a ação popular”.

Para Maria das Dores Meira, a implementação do Nosso Bairro, Nossa Cidade criou um quotidiano que “orgulha Setúbal” e uma “união entre moradores e autarquias” que abriu “um caminho sem igual no país, apesar das dificuldades”

De entre todas as dificuldades, a autarca aponta a necessidade de reabilitar os edifícios dos cinco bairros abrangidos pelo programa e assumiu, perante os moradores presentes na assembleia, que a Câmara Municipal vai garantir que “todos os edifícios serão impermeabilizados e pintados, de forma a resolver grande parte dos problemas de infiltrações dentro das casas”.

Para concretizar este projeto, a autarquia vai procurar “o necessário suporte financeiro para dar continuidade à pintura”, que está em fase de conclusão no bairro da Alameda das Palmeiras, seguindo-se o Forte da Bela Vista, as Manteigadas, a Quinta de Santo António, a Bela Vista e todos os outros bairros sociais que estão fora do território do programa Nosso Bairro, Nossa Cidade.

Trata-se de “uma grande obra” a acrescentar a outras que a autarquia executou nos últimos anos por empreitada e por administração direta, além de “todo o contributo voluntário que os moradores organizados concretizaram na reabilitação dos edifícios no âmbito do Setúbal Mais Bonita e com o apoio de mecenas”.

A edil sublinhou ainda outras vitórias conseguidas através da união entre os moradores da zona da Bela Vista e as autarquias, como as alterações à Lei do Arrendamento.

“Ao vosso lado, conseguimos mudar uma lei que tratava todos os inquilinos de habitação pública de forma injusta, retirando-lhes o direito efetivo à habitação. E será assim que ainda iremos lutar pelo aprofundamento da política de habitação pública e dos direitos dos moradores destas casas.”

Cinco anos após o arranque do programa Nosso Bairro, Nossa Cidade, Maria das Dores Meira afirma que os moradores da zona da Bela Vista têm sido “os grandes autores da obra de transformação” dos bairros, porque abdicam dos tempos livres para “pintar prédios, melhorar pátios, criar coisas novas para todos os moradores”.

Para dar continuidade a esta transformação, nos próximos cinco anos, os moradores, reunidos no dia 7 em assembleia, aprovaram, por unanimidade, a Declaração da Bela Vista, documento no qual afirmam “estar envolvidos e implicados” no Nosso Bairro, Nossa Cidade e que este “deve ser prosseguido e reforçado por todos os seus protagonistas”.

Analisando o que impulsionou o programa municipal, os moradores estabelecem três grandes princípios, nomeadamente a participação nas decisões coletivas, como base do poder dos moradores, o compromisso para com as decisões tomadas e a confiança para com as decisões tomadas.

Os moradores comprometem-se a eleger democraticamente representantes, a prosseguir com a organização de moradores através de condomínios, associações, grupos de trabalho, comissões ou grupos informais e a organizar-se de modo a que garantam o seu direito a participar nas decisões coletivas e na gestão e manutenção dos espaços comunitários.

A realização de atividades que contribuam para a requalificação e manutenção física e ambiental, a concretização de atividades que contribuam para o desenvolvimento das áreas da saúde, da educação, da cultura e do desporto nos bairros e a participação em grupos de trabalho em áreas de desenvolvimento da vida no bairro são outros compromissos assumidos.

Tendo em conta estes princípios, nos próximos cinco os moradores assumem como projetos a concretizar a constituição de condomínios organizados ou de uma organização informal em cada prédio, que cada bairro tenha uma comissão ou uma associação de moradores e o desenvolvimento de compromissos contratuais entre cada bairro e as entidades apropriadas de acordo com os interesses do coletivo dos moradores e a constituição de um Conselho de Bairros.

Os moradores pretendem ainda dar continuidade a projetos já existentes, como o Saúde no Bairro, as equipas comunitárias de higiene urbana, as equipas comunitárias de obras, o Férias no Bairro, os espaços Nosso Bairro, Nossa Cidade, o apoio ao estudo, festas e passeios de organização local, o Festival Mudar o Olhar, o Garrrbage, Artelinhas e Tecidos e outros projetos de iniciativa local.

A Declaração da Bela Vista define, igualmente, as preocupações a ter em conta na ação para os próximos cinco anos, entre as quais prosseguir a requalificação dos edifícios e das habitações cuidando da eficiência energética, dar continuidade à melhoria e manutenção da iluminação pública, melhorar a higiene pública, requalificar o espaço público e melhorar a fiscalização.

A melhoria da oferta dos transportes públicos, a envolvência da comunidade cigana no programa, o reforço da participação de moradores jovens, a sensibilização dos moradores para os cuidados com as suas casas e a melhoria da resposta das autoridades e dos serviços comunitários são outras preocupações assumidas.

Outra preocupação dos moradores, que não ficou contemplada no documento, mas que “deve ser sublinhada como uma das principais conclusões da assembleia”, como afirmou o vereador Carlos Rabaçal, é a necessidade de construção de um centro de saúde na área da Bela Vista.

“As populações devem lutar por isto, porque é difícil para muitos moradores desta área da freguesia de São Sebastião deslocarem-se para Vale do Cobro. Residem aqui mais de 10 mil pessoas, por isso faz todo o sentido existir um centro de saúde nesta zona”, sublinhou o morador Francisco Sousa, representante do Forte da Bela Vista.

Além da aprovação da Declaração da Bela Vista, os residentes fizeram o balanço de cinco anos de trabalho, com 287 compromissos assumidos em três encontros de moradores, através de breves resumos, por representantes de cada bairro.

Carla Brunheira, moradora da Alameda das Palmeiras, salientou a implementação do projeto A Nossa Casinha, que permite a realização de atividades para jovens e para a população sénior, além de um conjunto de diversas obras, como a reabilitação de edifícios e de espaços verdes.

A realização de festas populares e a criação de uma equipa comunitária de higiene urbana e espaços verdes, composta por dois moradores que fazem a limpeza dos pátios e espaços comuns, e o Festival Cara ou Coroa, que, no final de março, promoveu a pintura em graffiti de nove empenas de edifícios da Alameda das Palmeiras, foram outros projetos evidenciados.

No Bairro da Bela Vista, segundo a moradora Fernanda Rodrigues, também houve “muito trabalho feito”, como a pintura de 32 edifícios e o fecho de 36 acessos a escadas, realizados no âmbito do Setúbal Mais Bonita, e outras obras de reabilitação de edifícios, lideradas pela autarquia, através de empreitadas e administração direta.

A equipa comunitária de reabilitação de edifícios, composta por moradores, também executou diversas obras de reparação de fachadas e coberturas, entre outras.

A criação de uma equipa comunitária de higiene urbana, o Festival Mudar o Olhar, os projetos Garrrbage e Artelinhas, as festas populares e o espaço Nosso Bairro, Nossa Cidade foram outras ações que envolveram a participação dos moradores.

Quanto ao bairro do Forte da Bela Vista, além das obras de reabilitação de dezenas de edifícios, da realização de festas populares, da criação de um regulamento para a utilização de espaços comuns e do jornal “Boletim do Forte”, o morador Francisco Sousa sublinha como “joia da coroa” o projeto Passeio Pedonal O Despertar.

“É um projeto que resulta do trabalho coletivo de todos. Os moradores procuraram apoios, de norte a sul do país, e conseguiram que várias empresas e instituições contribuam com a doação de quase todos os materiais necessários para a obra”, vincou Francisco Sousa.

Um miradouro, zonas de estadia e de recreio, espaços desportivos e um parque infantil integram o futuro Passeio Pedonal O Despertar, projeto de requalificação da barreira do Bairro do Forte da Bela Vista, que resulta de uma proposta de beneficiação para aquele espaço feita pela comunidade local no âmbito 3.º Encontro de Moradores.

Quanto às Manteigadas, a moradora Elisa Correia frisou as melhorias conseguidas através da reabilitação de edifícios e espaços verdes, bem como a realização de festas populares e a criação do Espaço Nosso Bairro, Nossa Cidade, que permitiu criar três grupos de trabalho para a infância, juventude e população sénior.

Bruno Silva, da Quinta de Santo António, sublinhou também a reabilitação de edifícios e espaços públicos no bairro e a realização de festas populares.

Outros projetos específicos também estiveram em destaque, como o Descobrir em Comunidade, que já envolveu mais de 500 participantes em 16 passeios, o Férias no Bairro, que já proporcionou, desde 2012, a ocupação de tempos livres durante as férias escolares a mais de cinco mil crianças e jovens e os projetos de formação, que já envolveram cerca de 1200 moradores.

No encerramento do encontro, o presidente da Junta de Freguesia de São Sebastião, Nuno Costa, afirmou que este é “um momento particularmente feliz da vida do programa e do aprofundamento da democracia”.

O autarca sublinhou que “o imenso trabalho realizado é um orgulho para todos” e permitiu construir um “caminho ímpar no país”.

Nuno Costa revela “otimismo” face aos próximos cinco anos, uma vez que “o mais difícil, que foi colocar de pé um programa muito ambicioso”, já foi conseguido.

Já o vereador Carlos Rabaçal vincou o facto de o programa Nosso Bairro, Nossa Cidade não ser um programa de inclusão social, mas sim “de participação democrática e coletiva das pessoas”, em que “os moradores são envolvidos na decisão e na execução para melhorar a qualidade de vida de todos”.

Após a sessão de encerramento dos trabalhos, o convívio entre os moradores prosseguiu com apontamentos de dança e de teatro, organizados pela comunidade local, e terminou com um jantar.