A Relevância do Bosque Ibérico na História Peninsular - conferência - Exposição A Floresta. Muito mais do que madeira

A importância dos bosques no desenvolvimento dos povos na Península Ibérica centrou a reflexão, no dia 4, ao final da tarde, em Setúbal, na segunda conferência de um ciclo integrado na exposição “A Floresta – muito mais do que madeira”.


“Tenho 85 anos e vou três vezes por ano a florestas tropicais. Fico assustado pelos meus netos, tal é a destruição”, alertou Jorge Paiva, botânico e investigador do Centro de Ecologia Funcional da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra na sessão “A Relevância do Bosque Ibérico na História Peninsular”.

No encontro, realizado na Casa da Baía, o orador desta conferência organizada pelo Exploratório – Centro Ciência Viva de Coimbra em parceria com a Fundação “la Caixa” e com apoio da Câmara Municipal, vincou que, desde o aparecimento da espécie humana, só restam no planeta cerca de “20 por cento de total de florestas”.

O botânico traçou uma retrospetiva histórico-científica da ocupação florestal no mundo e, em particular, na Península Ibérica, da última glaciação aos tempos contemporâneos, caracterizando os diferentes tipos de floresta que, ao longo de milénios, existiram no território ibérico.

Mais do que apresentar uma linha cronológica de acontecimentos e de debitar aspetos técnico-científicos da natureza, Jorge Paiva partilhou saberes e curiosidades das florestas, da relevância que estas tiveram para o desenvolvimento da espécie humana e a importância que continuam a ter para a sobrevivência do planeta.

“Nós vivíamos da floresta”, afirmou, para salientar que, “quando D. Afonso Henriques tornou isto [Portugal] independente, o território era um autêntico carvalhal e grande parte do litoral tinha uma mancha enorme de pinheiros.” Mas os bosques desapareceram. “Tivemos o azar dos Descobrimentos”, ironizou.

Para a construção de cada nau, indicou, “eram necessários entre dois a três mil carvalhos, a que se juntavam os pinheiros mansos, utilizados em exclusivo nos mastros”. E, acrescentou, “só não foi pior porque antigamente não havia camiões para transportar a madeira”, pelo que algumas zonas ficaram intocadas.

Uma delas é a Serra da Arrábida, “uma relíquia”, como classifica Jorge Paiva. Apesar da proximidade ao litoral e dos grandes estaleiros de construção naval, sobreviveu. “E sabem porque é que a Arrábida ainda aqui está? Porque pertenceu à Igreja, e nesse património ninguém tocava.”

Quando o país ficou sem florestas, o povo foi viver da pastorícia e, em 1565, D. Sebastião ordenou, na célebre “Lei das Árvores”, a rearborização de baldios ou propriedades privadas de todos os municípios com pinheiro bravo, castanheiros, carvalhos e outras espécies adaptadas aos solos.

Entre os inúmeros lapsos de gestão da floresta em Portugal, como “a plantação absurda de eucaliptos na década de 80”, Jorge Paiva apontou o mais grave. “O fim dos serviços florestais foi um erro tremendo e justificado pelo peso financeiro que este acarretava”. E o resultado está à vista. “Um país transformado num deserto de pedras.”

Nesta evolução, o investigador resume a história a três momentos cruciais. “Primeiro vivíamos em exclusivo das florestas. De seguida, aprendemos a domesticar os animais e a compreender as plantas, ainda em harmonia com as florestas. Depois, foi o disparate completo.”

A conferência “A Relevância do Bosque Ibérico na História Peninsular” está integrada num ciclo de encontros que visa refletir sobre temas relacionados com a exposição “A Floresta – muito mais do que madeira”, patente ao público no Largo José Afonso, até 25 de abril.

Esta primeira exposição itinerante em Portugal da Fundação “la Caixa”, numa organização conjunta com o BPI, em parceria com a autarquia, alerta para a importância ambiental, económica e social das florestas, através de diversos recursos, instalados num espaço com 30 por 10 metros.

A mostra pode ser visitada de segunda a sexta-feira das 12h00 às 14h00 e das 15h00 às 20h00 e aos sábados, domingos e feriados das 11h00 às 14h00 e das 15h00 às 20h00.

Inclui visitas guiadas para o público em geral, de segunda a sexta-feira às 18h00 e aos sábados, domingos e feriados às 12h00 e às 18h00, e visitas de grupos escolares, de segunda a sexta-feira das 09h30 às 13h30 e das 15h00 às 17h00, com marcações pelo 211 216 262.

O ciclo de conferências relacionado com esta mostra ambiental foi iniciado a 19 de março, numa sessão sobre “A Árvore e a Cidade”, conduzida por Raquel Pires Lopes, investigadora e estudante de doutoramento em Biologia no Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Professores da Universidade de Aveiro.

Este ciclo tem ainda agendadas mais duas sessões, sempre às 18h00, na Casa da Baía, a primeira a 10, com Elizabete Marchante, investigadora do Centro de Ecologia Funcional da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, que apresenta “À conversa sobre plantas invasoras: o que são, onde estão e como as controlar”.

A encerrar o ciclo, no dia 15, Paulo Magalhães, comissário da exposição “A Floresta – muito mais do que madeira” e responsável pela Casa Comum da Humanidade em Portugal, dinamiza a conferência “Dos tangíveis aos intangíveis florestais: um novo quadro conceptual de suporte à sustentabilidade”.