“Finuras”, como era conhecido na cidade, é perpetuado numa praceta na Quinta Alves da Silva, bairro no qual viveu e trabalhou num pequeno espaço de garagem, futuramente oficina-museu, dando largas à imaginação e criatividade para criar várias máquinas e objetos.

“Homem difícil de definir, Francisco Finura era, segundo as próprias palavras, um operário especializado em trabalhos não especializados”, recordou a presidente da Câmara Municipal de Setúbal, Maria das Dores Meira, na cerimónia de inauguração do espaço público com o nome do homenageado.

A autarca partilhou que “Finuras”, falecido em 2012, “era alguém que surpreendia constantemente, com curiosidade ilimitada pela vida e pela terra onde nasceu”. Acrescentou, igualmente, que é a “prova de que é sempre possível aspirar a saber mais e a ir além do que os tempos, e aqueles que os comandam, impõem”.

Francisco Finura foi, entre muitas outras coisas, professor de hipnose, telepatia e retenção memorial, psicanálise, magnetismo e fascinação, atividade que acumulou com a de artista de variedades, ilusionista, faquir, toureiro, arqueólogo, marinheiro de longo curso e mergulhador, ou, como lhe chamavam na época, homem-rã.

O homem que se fez transportar durante anos numa estranha bicicleta pelas ruas da cidade, depois de ter começado a trabalhar aos 9 anos como afinador destes veículos, foi também fabricante e conserveiro, industrial, lutador, boxeur e rei, ou, melhor, o Rei do Carnaval de Setúbal.

“Eu sou aquele homem muito grande que vive num mundo muito pequeno”, disse, em tempos, “Finuras”, frase recuperada por Maria das Dores Meira para afirmar que o homenageado “precisava de muito mais espaço e tempo para expandir a permanente vontade de entender e transformar o mundo, num tempo em que nem tudo era permitido a todos”.

A autarca salientou que, “felizmente, Francisco Finura não precisou de ser nem doutor nem engenheiro para ser tudo o que quis ser”, num tempo “em que o acesso a instrumentos básicos de conhecimento era limitado, quer pela pobreza, quer pelas limitações impostas por um regime”.

E o que quis ser e o que fez “será sempre muito mais do que muitos nós poderão aspirar”, vincou a presidente da autarquia sadina sobre o homem que construiu “estórias que maravilharam e intrigaram muitos setubalenses, estórias que continuam a ser passadas de boca em boca, de velhas para novas gerações”.

A praceta que ganhou o nome de Francisco Finura, acessível através da Rua Alves da Silva, uma iniciativa da União das Freguesias de Setúbal e da Câmara Municipal, recebeu ainda uma manifestação artística, um desenho em grafitti da autoria de Zé Nova e João Varela.

“Operário especializado em trabalhos não especializados.” A frase, uma das mais carismáticas e que melhor descrevem o génio da figura popular setubalense, acompanha a obra de arte pública, que partilha uma das imagens mais conhecidas de “Finuras”, de fato, lenço branco na lapela e a fumar cachimbo.

O presidente da União das Freguesias de Setúbal, Rui Canas, sublinhou a importância da iniciativa que “reconhece uma figura ímpar da cidade, uma pessoa que acrescentou algo de diferente, de melhor, à vida e ao quotidiano setubalense e que hoje faz parte da memória de todos”.

O filho do homenageado, igualmente Francisco Finura, agradeceu, emocionado, “a todos os que ajudaram a concretizar este projeto”, perante amigos e populares que marcaram presença na cerimónia.

Momentos da vida e obra do setubalense são também partilhados no espaço de garagem no qual trabalhou, localizado naquela praceta, agora convertida em oficina-museu, um projeto, ainda em fase de desenvolvimento, impulsionado pelos filhos, Francisco e Patrícia Finura. 

A oficina-museu abriu portas em dia de homenagem para partilhar fotografias, documentos, artefactos, ferramentas, máquinas e alguns artigos pessoais de Francisco Finuras, com destaque para a bicicleta, personalizada e reinventada pelo próprio, em que se fazia transportar pela cidade.

“Isto é apenas uma amostra daquilo que o espaço vai ser, para já com algumas das peças mais significativas. O espólio é muito vasto, pelo que vamos tentar expor tudo”, esclareceu o filho, para adiantar que a ideia, a finalizar em breve, “é ter a oficina-museu aberta ao público”.

A cerimónia de inauguração da praceta contou com um apontamento musical pelo grupo típico Cantares do Sado, a par da leitura de poemas por Alexandrina Pereira e João Faleiro Paixão escritos em honra de Francisco Finura, tanto em vida, como a título póstumo.

A figura de “Finuras” permanece na memória e no imaginário coletivo da população de Setúbal, alto, de cachimbo e com um lenço no bolso do peito, mesmo quando vestia fato de macaco. Recebeu, a 15 de setembro de 2010, no âmbito das comemorações do Dia de Bocage e da Cidade, a Medalha de Honra de Setúbal, na classe Atividades Culturais.