Comemorações 48 anos do 25 de Abril | Debate "O tempo histórico e a história do 25 de Abril"

O que está por investigar na história do 25 de Abril foi tema em destaque no debate “O tempo histórico e a História do 25 de Abril”, que no dia 21 de abril reuniu historiadores e politólogos no Salão Nobre dos Paços do Concelho.


Numa curta declaração no início da sessão, o presidente da Câmara Municipal de Setúbal, André Martins, indicou que este era o primeiro de “um conjunto alargado” de debates que serão feitos no concelho sobre o 25 de Abril, “que abriu as portas e as janelas sobre uma noite escura que durante 48 anos Portugal viveu”.

Durante os quatro anos do mandato, até 2025, Setúbal vai comemorar Abril “falando sobre as transformações importantes que trouxe à sociedade portuguesa”, para, de acordo com André Martins, refletir sobre a sua importância e “que as novas gerações tenham acesso à informação e possam decidir sobre o futuro deles e o futuro de Setúbal”.

O distanciamento relativamente aos factos que o tempo permite, a importância do trabalho da nova geração de historiadores, ainda crianças em 1974, e a questão do acesso às fontes foram igualmente abordados no debate, integrado no projeto “Venham Mais Vinte e Cincos”, que assinala em Setúbal, até 2025, o cinquentenário da “Revolução dos Cravos”.

No encontro do dia 21, Irene Pimentel, doutorada em História Institucional e Política do século XX e galardoada com o Prémio Pessoa em 2007, afirmou que “houve vários 25 de Abril” e “já há muita investigação” sobre a Revolução de 1974, mas admitiu que vai sempre haver “coisas novas” a saber-se.

Sobre o que está por estudar, a investigadora apontou “a história dos derrotados, dos retornados, da forma como acabou a guerra colonial, do MDLP e do ELP e dos governos provisórios”.

“É fundamental a nova geração de historiadores. A nossa geração não ligou nenhuma ao facto de ter havido quatro mortos e vários feridos. Hoje os novos historiadores estão a estudar isso e sentem-se enganados”, disse, quando o debate se centrava no distanciamento que 48 anos permitem na análise dos factos.

Fernando Rosas, historiador e professor emérito da Universidade Nova de Lisboa, recordou que “o tempo muda a perceção” dos factos e defendeu que deve escrever-se sobre um acontecimento “quando ele está resolvido politicamente” e o que é escrito já não o pode influenciar.

António Costa Pinto, historiador, politólogo e professor do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, admitiu que a composição do painel do debate podia “enganar”, porque “a grande maioria dos académicos que trabalham sobre o 25 de Abril” pertencem a uma geração mais nova, e referiu que, “em termos do que passa para a memória coletiva”, hoje sabe-se quase tudo sobre a Revolução.

Disse ter apenas “três dúvidas”, quanto à dimensão internacional, no que diz respeito aos apoios estrangeiros às várias forças políticas, quanto às ligações partidárias dos “oficiais gonçalvistas” e quanto à relação que forças atuais de direita radical pretendem ter com o 25 de Novembro, que, afirmou, foi feito por “forças democráticas moderadas” e “não é verdade” que tenha sido uma tentativa do PCP de tomar o poder.

Admitindo fazer parte da Democracia que o destino do processo revolucionário divida os historiadores “do ponto de vista da sua explicação”, Fernando Rosas considerou que “houve várias sensibilidades no 25 de Abril, mas ele não é de direita” e “tem cor”, pois foi “contra o regime fascista, contra a guerra colonial, contra a PIDE e a repressão” que a Revolução se realizou.

“O 25 de Abril é das maiores alterações da História de Portugal. É das mais potentes reinvenções populares da nossa História”, declarou, por seu lado, o professor catedrático e doutor em Ciência Política Adelino Maltez, sublinhando que “um mês depois” estavam criadas as raízes do regime atual e que “o novo regime soube captar muito rapidamente as várias famílias político-culturais”.

O académico manifestou “muito receio” de que se percam as fontes relativas aos Governos Provisórios, questionando o paradeiro “do principal arquivo”, que seria o de Magalhães Mota, mas Silvestre Lacerda, diretor-geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas, garantiu que os arquivos de Melo Antunes e Costa Brás têm cópias das atas dos conselhos de ministros desse período e estão disponíveis para consulta pública na Torre do Tombo.

Albérico Afonso Costa, historiador e professor coordenador do Instituto Politécnico de Setúbal, disse que não tem sido possível o acesso a fontes militares, da PSP e da GNR e que, no âmbito do estudo que tem realizado sobre o 25 de Abril em Setúbal, “teria sido muito importante saber” por que razão o comandante do quartel da cidade teve “uma posição de neutralidade”.

“Há uma dimensão ao nível da história local em que há um atraso enorme da investigação. É muito importante conhecer as ondas de choque que o 25 de Abril provocou nas diferentes cidades em Portugal”, considerou ainda Albérico Afonso Costa, para quem isso permitiria comprovar “a desigualdade” que havia no país.

Entre os impactes imediatos da Revolução, este historiador recordou que até 1974 a Câmara Municipal de Setúbal apenas foi presidida por licenciados ou por oficiais do exército, mas logo depois foi liderada por dois operários, Vítor Zacarias da Piedade Sousa (1975) e Francisco Lobo (1975 e 1979-1982).

Moderado pelo jornalista Pedro Tadeu, o debate foi organizado em conjunto pela Câmara Municipal de Setúbal e por Diário de Notícias, Jornal de Notícias e TSF, tendo sido transmitido em direto a partir dos sites destes três órgãos de comunicação social e em antena pela rádio de notícias.