A iniciativa, organizada pela Universidade Sénior de Setúbal em parceria com a Câmara Municipal, no âmbito das comemorações do bicentenário do nascimento do historiador Almeida Carvalho (1817-1897), deu a conhecer aspetos da vida do setubalense, alguns menos conhecidos, nomeadamente a relação conflituosa com os pais.

Um dos motivos que explica essa relação, adiantou Carlos Mouro, deve-se ao facto de, aos 15 anos, Almeida Carvalho ter sido obrigado pelo pai, António Coelho de Carvalho, a trabalhar com ele como escrivão.

“Ele queria estudar Latim, mas não conseguiu fugir à vontade do pai. Nas memórias que deixou manuscritas, Almeida Carvalho explica que a lei exigia que tivesse 25 anos para exercer a profissão de escrivão, mas de alguma forma o pai usou a influência que tinha para que ele, com apenas 15, fosse nomeado para esse cargo.”

Perante uma plateia de cerca de meia centena de pessoas, Carlos Mouro destacou que, ao longo das suas memórias, o historiógrafo setubalense “tem para com a família expressões nada agradáveis, o que demonstra uma relação nada fácil com os pais”, ao contrário da “boa relação que mantinha com a sogra, a quem tece sempre grandes elogios”.

Por outro lado, o pai nunca lhe terá perdoado o facto de “ter passado para o ‘outro lado da barricada’, ou seja, de se ter rendido à nova situação política instituída pelos liberalistas”.

A vida de Almeida Carvalho, nascido no dia 5 de março de 1817, no n.º 224 da Rua da Praia, atual Avenida Luísa Todi, foi estudada por alguns investigadores, mas “toda a bibliografia sobre ele não foge muito ao que ele próprio escreveu nas suas memórias”

As memórias manuscritas foram editadas em livro pela Junta Distrital de Setúbal, em 1968, no âmbito da coleção “Acontecimentos, lendas e tradições da região setubalense”, dividida em seis volumes, mas Carlos Mouro ressalva que “o que está impresso não corresponde exatamente ao que está escrito”.

O investigador de história local adiantou, no entanto, que há a perspetiva de, no final das comemorações do bicentenário, organizadas pela Câmara Municipal de Setúbal com parcerias, “ser republicada uma edição especial do volume tal e qual está no manuscrito”.

Carlos Mouro abordou também aspetos da vida profissional de Almeida Carvalho, que, entre 1838 e 1882, se dedicou à taquigrafia, na então Câmara dos Pares, onde foi diretor-geral, bem como o pioneirismo do setubalense nos estudos arqueológicos, na criação da imprensa local periódica e do mutualismo.

Em 1849, fundou a Sociedade Arqueológica Lusitana, que teve grande importância no trabalho de investigação e escavações nas ruínas da antiga Cetóbriga.

Em 1855, fundou “O Setubalense”, cujo primeiro número foi publicado a 1 de julho, e utilizou as páginas do jornal para “confrontar os poderes instituídos localmente, o que lhe vai trazer alguns dissabores, como um atentado que sofreu a 31 de agosto do mesmo ano”.

Também em 1855 cria a Associação Setubalense das Classes Laboriosas, pioneira do mutualismo em Setúbal.

Amanhã, Carlos Mouro vai falar precisamente sobre esta associação na conferência “Almeida Carvalho e o pioneiro mutualismo local”, que se realiza a partir das 21h30, no Salão Nobre da Associação de Socorros Mútuos Setubalense.

Esta associação subsistiu até 1923, ano em que se operou um processo de integração na entretanto criada Associação Operária de Socorros Mútuos Setubalense, fundada em 1888.

As comemorações do bicentenário do nascimento de João Carlos d’Almeida Carvalho, de homenagem à figura do homem que, entre outros aspetos, se destacou pela investigação da história da região, decorrem até setembro, com diversas iniciativas culturais.

O evento é organizado numa parceria entre o Museu de Arqueologia e Etnografia do Distrito de Setúbal, a Câmara Municipal de Setúbal, a Associação de Municípios da Região de Setúbal, o Arquivo Distrital de Setúbal, a Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão e a Universidade Sénior de Setúbal.

 

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