Conferências do Forte | futebol de praia | Mário Narciso e Madjer

O futebol de praia da seleção nacional na última década foi tema de conversa, ao início da noite de 24 de fevereiro, na segunda sessão do ciclo Conferências do Forte, com o selecionador nacional Mário Narciso e o antigo jogador Madjer.


“Futebol de Praia – o percurso da seleção portuguesa na última década” deu tema ao encontro realizado no Forte de Albarquel, numa organização da Câmara Municipal de Setúbal, com os dois convidados a partilharem factos, experiências e curiosidades que contribuem para o sucesso de uma modalidade cada vez mais consolidada no país.

O sucesso da seleção de futebol de praia, em particular nos últimos anos, com vários títulos mundiais e europeus e, também, conquistas individuais, é explicado pelo muito trabalho. Mas, para o selecionador nacional, o setubalense Mário Narciso, é mais do que isso: “Nascemos para isto!”

Mário Narciso foi eleito em dois anos consecutivos como o melhor treinador do mundo. Desde 2013 à frente da seleção nacional de futebol de praia, tendo orientado a formação em mais de duas centenas de jogos e conquistado diversos títulos, entre os quais dois mundiais e três mundialitos, apontou a mudança de paradigma na modalidade.

“Antigamente, a seleção era formada por jogadores que vinham do futebol de 11. Agora, são atletas que se dedicam a jogar futebol de praia.”

O selecionador nacional acrescentou ainda a vantagem do clima português. “O nosso inverno não é tão longo como noutros países e podemos jogar na praia durante mais tempo.”

As recentes conquistas também ajudaram a impulsionar a modalidade e a atrair mais praticantes. “Os jogadores veem a história recente, os títulos conquistados. E, por isso, têm vontade de mostrar que são capazes. Agora, estão também constantemente a aparecer novos valores, o que antes não acontecia com tanta frequência.”

Os últimos nove anos da seleção nacional estão intimamente ligados ao selecionador Mário Narciso. “Era difícil fazer melhor”, reconhece.

Contudo, considera que é possível continuar na rota do sucesso. “Quando cheguei, tinha um lote curto de jogadores. Agora tenho muito mais e até me vejo aflito para escolher.”

João Vítor Saraiva, Madjer no futebol de praia, abraçou em 2020 o cargo de coordenador nacional de futebol de praia, depois de várias épocas como jogador, com perto de seis centenas de jogos e mais de um milhar de golos, que lhe valeram vários títulos nacionais e internacionais. Ainda faz falta à seleção?

“O Madjer? Foi ‘só’ o melhor jogador do mundo de todos os tempos. Tenho um leque de grandes jogadores, mas quem é que não o queria ter ainda?”, comentou Mário Narciso. “Excelente finalizador, grande visão de jogo, técnica e fisicamente muito bom, extensão do treinador em campo. Tinha tudo.”

Madjer já pendurou as botas. Melhor, já sacudiu a areia dos pés no futebol de praia. Mas continua empenhado na afirmação da modalidade. “Somos um país pequeno mas recheado de talento, com muita qualidade. Temos, sobretudo, pessoas apaixonadas pelas modalidades que praticam.”

O antigo praticante recordou que o sucesso do futebol de praia nacional não começa nos últimos dez anos. “Jogadores como Zé Miguel, Nunes e o setubalense Hernâni foram grandes impulsionadores da modalidade, que, antigamente, ainda era pouco credibilizada em Portugal.”

A conquista do primeiro campeonato do mundo marca a mudança. “Houve a mudança do chip. As pessoas começaram a olhar de forma diferente para o futebol de praia. Já não éramos vistos como um grupo de rapazinhos que andava pelo país a apanhar sol e a beber caipirinhas na praia.”

A entrada da Federação Portuguesa de Futebol na organização da modalidade também trouxe um acréscimo de profissionalismo. Contudo, para o atual coordenador nacional de futebol de praia, ainda há muito caminho a percorrer, em particular na formação a nível de clubes.

“Começámos a construir a casa pelo telhado, isto é, pela seleção nacional. Agora temos de chegar às bases, aos clubes e à formação. O futebol tem uma faixa etária muito elevada. A perspetiva é apostar cada vez mais nos jovens e criar novas competições para estes escalões.”

Sobre o selecionador Mário Narciso, diz que não há muito a explicar. “Os números e as conquistas não enganam. O mister tem muito mais do que um treinador. Ele faz uma leitura muito humana do jogador. Além de ser um treinador de excelência. Temos o homem certo no lugar certo.”

Nesta perspetiva, o técnico e selecionador da equipa nacional de futebol de praia revela a mentalidade. “Em cada jogador tenho um amigo. E não faço grande esforço por isso. Quando seleciono os jogadores não olho a nomes. São aqueles que acho que podem servir melhor os interesses da seleção nacional.”

Em termos de preparação, comparativamente ao futebol de 11, Mário Narciso não aponta grandes diferenças para o futebol de praia. “Em campo, trabalha-se, em traços gerais, resistência, velocidade e força. No futebol de praia, trabalha-se mais um pouco a força do que a velocidade.”

Neste aspeto, Madjer acrescentou que a preparação física é diferente porque o futebol de praia acaba por ser uma modalidade sazonal. “No interregno, este ano, por exemplo, de setembro a abril, têm de ser os futebolistas a manter a forma.”

Ao longo da carreira, Madjer colecionou momentos inesquecíveis, um dos quais no jogo de despedida contra a Itália. “Estávamos a ganhar 6 a 3. Queria muito entrar nos últimos minutos para a celebração do título. Não entrei. Agora, recentemente, é que o mister me explicou o porquê. Estava tão entusiasmado que se esqueceu de mim…”

Sobre o futebol de praia nacional, adiantou que este ano o Campeonato de Elite, o principal, vai ter oito equipas, entre as quais a do clube setubalense São Domingos Futebol Clube, com vários elementos presentes no público deste encontro, a que se juntou a antiga campeã olímpica Rosa Mota.

“As quatro primeiras classificadas são apuradas para o playoff campeão, para decidir o campeão nacional, enquanto as duas últimas da fase regular descem de divisão. Temos ainda o Campeonato Nacional [divisão abaixo do Campeonato de Elite], a Taça de Portugal e a Supertaça de Portugal.”

Mário Narciso e Madjer foram os convidados do segundo encontro das Conferências no Forte, individualidades que, para o vereador com o pelouro do Desporto na Câmara de Setúbal, Pedro Pina, tinham de marcar presença neste ciclo. “Mário Narciso é um homem e embaixador desta cidade e o Madjer é um nome incontornável do futebol de praia.”

O autarca enalteceu ainda as presenças da equipa de futebol de praia do São Domingos Futebol Clube, “este ano na elite da modalidade”, e de Rosa Mota, antiga campeã olímpica e embaixadora de Setúbal, “que será certamente, ainda em data a definir, uma das convidadas deste ciclo”.

O novo projeto Conferências do Forte, com conversas conduzidas pelo jornalista setubalense Paulo Sérgio, leva várias personalidades do desporto a partilhar percursos profissionais e experiências de vida em encontros realizados regularmente no Forte de Albarquel.