Futebol feminino à conversa no Forte de Albarquel

Um acordo entre a Escola de Futebol Feminino de Setúbal e o Vitória Futebol Clube para desenvolver a modalidade foi anunciado numa conferência organizada a 23 de junho pela Câmara Municipal de Setúbal, na qual o vereador Pedro Pina defendeu políticas de igualdade de género.


Anunciado por Joaquim Bravo, vice-presidente da Escola de Futebol Feminino de Setúbal (EFFS), na conferência “Futebol Feminino – Uma afirmação cada vez mais visível”, realizada no Forte de Albarquel, o acordo de parceria prevê que a Escola fique responsável pela formação e o clube pelo escalão sénior, tendo sido aplaudido pelo vereador do Desporto da autarquia e pela treinadora Susana Covas.

“O que é fundamental é termos a capacidade de criar projetos sustentáveis”, disse Pedro Pina, salientando a necessidade de se “criar equilíbrios” nas “políticas estratégicas” e recordando que o Centro Cultural e Desportivo de Brejos de Azeitão, o qual tem crescido de uma forma “absolutamente extraordinária” com o apoio da Câmara Municipal e da Junta de Freguesia de Azeitão, também faz este ano a sua estreia no futebol feminino.

“Enquanto houver em Setúbal um clube que permite às meninas praticarem futebol, ele tem de ser discriminado [positivamente], afirmou. “O que estamos a fazer em Setúbal, já há algum tempo, é discriminar para construir essas políticas de igualdade, não porque é mediático ou porque fica bem ter futebol feminino, mas porque efetivamente temos de criar condições para a prática e que as nossas meninas possam, de facto, ter um acesso igual ao que os rapazes têm”.

Joaquim Bravo afirmou que a Escola de Futebol Feminino de Setúbal (EFFS) sentiu necessidade de ganhar “massa crítica”, pelo que, na sequência de uma proposta do Vitória Futebol Clube, optou por uma parceria com o “representante máximo” da região em termos de futebol.

Com o acordo, a EFFS passa a dedicar-se inteiramente à formação e o Vitória Futebol Clube fica exclusivamente com o futebol feminino sénior, “sendo toda a gestão apoiada pela Escola de Futebol Feminino”.

 Para justificar a necessidade de ganhar massa crítica, o dirigente recordou que, no campeonato nacional da II Divisão desta temporada, havia um clube do distrito com um orçamento de 700 mil euros, enquanto a Escola de Futebol Feminino de Setúbal contava com 12 mil euros para a equipa sénior.

 Em 2021/2022 havia cerca de 8000 praticantes de futebol feminino em Portugal, quatro vezes mais do que há dez anos, e Setúbal, com 670 jogadoras divididas por uma dezena e meia de clubes, era o quinto distrito com mais atletas federadas, atrás de Lisboa, Porto, Braga e Aveiro, sendo a EFFS o clube da região com maior número de inscritos, com um total de 65 dos benjamins aos seniores.

 Joaquim Bravo recordou que tudo começou há 21 anos, então apenas com futsal porque “não havia infraestruturas para ter competitividade no futebol”, tendo a transição do futsal para o futebol sido feita oito anos após a fundação, acabando nessa altura a modalidade de pavilhão.

“Temos atletas com 5 e 6 anos e a mais velha este ano tinha 28. Mas este foi um ano de recuperação pós-pandemia e ainda não recuperámos os números de 2019/2020, quando tínhamos 82 atletas. Perdemos cerca de 20 atletas, mas agora já está a acontecer o inverso, a procura já está a começar a evoluir e, o que é engraçado, cada vez mais pelos escalões mais baixos – benjamins, petizes, traquinas, iniciados…”, indicou.

De acordo com o dirigente, “há uma década, as jogadoras de futebol começavam muito tarde”, não antes dos 16 anos – tendo chegado a aparecer na Escola atletas já com 22 –, o que era “muito tarde”, porque ficavam sem “as bases necessárias” para se tornarem atletas completas no escalão sénior.

O vice-presidente da EFFS destacou o investimento feito pela Federação Portuguesa de Futebol (FPF) no futebol feminino, mas sublinhou que o trabalho dos clubes tem sido fundamental para a evolução da modalidade.

Susana Cova, que nas duas últimas épocas orientou a equipa de futebol feminino do Sporting depois de ter trabalhado vários anos nas seleções nacionais, considerou que o crescimento do futebol feminino resultou de “uma série de estratégias e planos” adotados pela FPF com um objetivo de longo prazo.

De acordo com Susana Cova, o facto de agora haver mais competições jovens, por exemplo, “fez com que haja cada vez mais jogadoras jovens a praticar a modalidade” e o que se pretende com as medidas adotadas é que o futebol feminino “não seja uma moda passageira, mas um projeto em evolução constante”.

A treinadora sublinhou que a Constituição portuguesa estabelece o direito à igualdade, no sentido de as possibilidades serem iguais para as pessoas de todos os géneros, e saudou a recente decisão da UEFA de obrigar os clubes que disputam as competições europeias masculinas a terem também equipas femininas.

Segundo Joaquim Bravo, a Escola de Futebol Feminino de Setúbal dispõe de “condições de primeira linha” em termos de infraestruturas para treinar, salientando a “discriminação positiva” do futebol feminino feita pela Câmara Municipal.

 O dirigente salientou o facto de em Setúbal ser possível a jogadoras da formação treinarem semanalmente num relvado natural, no Complexo Municipal de Atletismo, e que a autarquia tem feito “um esforço enorme” para dotá-lo de vários equipamentos, incluindo um ginásio.

Por isso, é possível a jogadoras de 17 ou 18 anos fazerem banho de gelo, o que “não acontece em nenhum clube de futebol de formação” e “alimenta-lhes o ego e a vontade de continuar”.

O vice-presidente da EFFS notou, no entanto, que “gerir atletas femininas não é o mesmo que gerir atletas masculinos”, porque no caso das raparigas existe “um grave problema” relacionado com o “compromisso” com a modalidade, pois vão perdendo o entusiasmo quando estão “num contexto amador de pequeno clube”, como é o caso da agremiação setubalense.

Referindo que “50 a 60 por cento” das futebolistas amadoras “baixam os braços e desistem”, Joaquim Bravo salientou que “é muito difícil recuperar uma jogadora que abandona o treino”, sendo necessário trabalhar aspetos como “motivação e recompensa”, por forma a gerir as suas emoções e expectativas.

Este foi o terceiro encontro do ciclo Conferências do Forte, iniciado a 20 de janeiro com a sessão “Ouro Olímpico – A história de um percurso”, que teve como convidado o triplista Pedro Pichardo, medalha de ouro para Portugal nos Jogos Olímpicos de Tóquio, disputados em 2021 na capital japonesa.

Seguiu-se, a 24 de fevereiro, o encontro “Futebol de Praia – O percurso da seleção portuguesa na última década”, que contou com as participações do selecionador nacional de futebol de praia, o setubalense Mário Narciso, e do antigo jogador e atual coordenador nacional de futebol de praia, João Vítor Saraiva, conhecido por Madjer.